sábado, 23 de maio de 2020

PCA, UMA CONCORRENTE DA FIDE


Como prometemos em nossa última postagem, iremos agora informar os nossos leitores sobre o que foi a PCA, sigla de Professional Chess Association, ou, traduzindo para o português, Associação dos Profissionais de Xadrez. Praticamente todos os enxadristas conhecem a FIDE, que é a Federação Internacional de Xadrez. A FIDE é a instituição maior do xadrez internacional, que tem sua sede na cidade de Lausanne, na Suíça. Esta entidade reúne as numerosas federações nacionais e, com o aval delas, dirige o xadrez mundial. Atualmente, a FIDE detém a exclusividade na organização das atividades enxadrísticas em âmbito internacional, mas nem sempre foi assim. No passado, houve outras entidades que rivalizaram com a FIDE pelo controle do mundo do xadrez e pela organização dos campeonatos mundiais, e uma delas foi a PCA, criada pelos Grandes Mestres Garry Kasparov e Nigel Short, em 1993.


Kasparov e Short foram os fundadores da PCA


O MI brasileiro Rubens Filguth, em sua importante obra Inteligências em confronto: campeonatos mundiais de xadrez, traz um relato detalhado sobre a criação da PCA e a divisão que abalou o mundo do xadrez no período de 1993 a 2006, quando existiram dois campeões mundiais paralelamente, o campeão mundial oficial, coroado pela FIDE, e o campeão mundial "alternativo". Tentarei apresentar aqui um resumo do que narra o MI Filguth em seu livro. Vamos lá:

No início da década de 1990, o regime comunista da União Soviética entrou em colapso, e com isso Kasparov sentiu-se liberto do controle estatal exercido por aquele regime. Esse fato estimulou uma posição mais crítica do campeão, que, reclamando de corrupção e falta de profissionalismo por parte da FIDE, desfiliou-se da Federação Internacional e constituiu a Professional Chess Association (PCA). Sob a organização dessa nova entidade, Kasparov disputou um match válido pelo título mundial contra o GM inglês Nigel Short, que ano de 1992 havia superado o ex-campeão mundial Karpov na semifinal e o holandês Ian Timman na final do Torneio de Candidatos da FIDE, classificando-se para desafiar o então campeão Garry Kasparov pelo título mundial da FIDE. 
O match de 24 partidas entre Kasparov e Short foi realizado em Londres, em outubro de 1993, e Kasparov venceu de modo convicente, pelo placar de 12,5 x 7,5 (6 vitórias, 1 derrota e 13 empates). Ao mesmo tempo, também em 1993, a FIDE organizou um match válido pelo Campeonato Mundial, entre Karpov e Timman. Esse match foi disputado na Holanda e na Indonésia, e Karpov saiu vitorioso. A partir daí passaram a existir dois campeões do mundo simultaneamente. Esses incidentes representam a origem da divisão que perdurou até 2006, quando ocorreu a reunificação do título mundial. Enquanto essa divisão se manteve, Kasparov defendeu seu título pela PCA em 1995, contra Wiswanathan Anand, vencendo-o, mas, para surpresa geral, em 2000 o "Ogro de Baku" foi derrotado no match contra Vladimir Kramnik, da Rússia, que se sagrou o campeão mundial pela WCC (World Chess Council), instituição também criada por Kasparov em 1998 e que sucedeu a PCA, extinta em 1996.


Em 2000, Kasparov foi destronado por Kramnik, de forma surpreendente

Entre 1993 e 1999, Karpov manteve o título de Campeão Mundial pela FIDE


Pelo lado da FIDE, Karpov conservou o título em 1996, ao vencer o GM russo (hoje naturalizado norte-americano) Gata Kamsky, e em 1998, ao vencer Anand. Ele renunciou ao título em 1999, por discordar das novas regras estabelecidas pela FIDE para a disputa do título mundial, que decidiu substituir o formato tradicional de disputa (zonais, interzonais e Torneio de Candidatos) por um evento formado por matches eliminatórios entre vários participantes. Após a desistência de Karpov, sagraram-se campeões mundiais pela FIDE o russo Alexander Khalifman, em 1999, o indiano Anand, em 2000, o ucraniano Ruslan Ponomariov, em 2002, e o uzbeque Rustam Kasimdzhanov, em 2004.


Alexander Khalifman

Wiswanathan Anand

Ruslan Ponomariov

Rustam Kasimdzhanov


Em 2004, tanto Kramnik quanto Kasimdzhanov eram apontados como campeões, mas a FIDE estava trabalhando arduamente pela reunificação, e depois de diversas reuniões com lideranças do xadrez mundial, a Federação Internacional organizou um torneio visando apontar um novo campeão mundial, que se credenciaria para concorrer à reunificação do título máximo do xadrez. Esse torneio, equivalente a um Campeonato Mundial da FIDE, foi disputado na cidade de San Luis (Argentina), em 2005, e para jogá-lo foram convidados os oito melhores Grandes Mestres da época: Rustam Kasimdzhanov (Campeão Mundial da FIDE), Vladimir Kramnik (Campeão Mundial pela WCC), Michael Adams, Peter Leko, Garry Kasparov, Wiswanathan Anand, Veselin Topalov e Alexander Morozevich. No entanto, Kasparov e Kramnik desistiram da disputa, e com isso suas vagas foram atribuídas a Peter Svidler e Judit Polgar, observando-se como critério de escolha a pontuação na listagem de rating FIDE de julho de 2004 e janeiro de 2005. A participação de Judit Polgar nesse torneio fez dela a primeira mulher a competir pelo título mundial absoluto... infelizmente, ela não se saiu bem na competição, finalizando em último lugar, com 4,5 pontos em 14 possíveis. Na outra ponta da tabela, o campeão foi o búlgaro Veselin Topalov, isolado com 10,0/14,0 pontos, um ponto e meio à frente de Svidler e Anand, que compartilharam o segundo lugar.
A reunificação do título mundial ocorreu apenas no ano de 2006, quando se celebrou um match entre o campeão da FIDE, Topalov, e o campeão da WCC, Kramnik. O match, que teve 16 partidas, foi jogado na cidade russa de Elista, e foi vencido por Kramnik por apenas 1 ponto (8,5 x 7,5). Esse match entre Topalov e Kramnik foi marcado por várias polêmicas e acusações de ambas as partes, e deu início a uma rivalidade duradoura (para saber mais sobre o assunto, leia o artigo do GM Rafael Leitão, clicando aqui). Porém, como o resultado do match foi oficialmente reconhecido, finalmente a divisão no mundo do xadrez foi superada, e um único campeão voltou a ostentar o título mais cobiçado da história do nosso esporte!


Kramnik (à esq.) tornou-se Campeão Mundial em 2006, ao derrotar Topalov


Fontes
FILGUTH, Rubens. Inteligências em confronto: campeonatos mundiais de xadrez. Porto Alegre: Artmed, 2006.
Wikipedia, a enciclopédia livre. 

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