Há 48 anos, no dia 11 de julho de 1972, foi jogada em Reykjavik, capital da Islândia, a primeira partida daquele que ficou conhecido como "O Match do Século", entre o campeão mundial russo Boris Spassky e o desafiante estadunidense Robert ("Bobby") James Fischer. Este foi sem dúvida o match mais analisado, mais comentado e sobre o qual mais se escreveu em toda a história do xadrez. E isso porque este foi um confronto que extrapolou o âmbito esportivo, uma vez que se inseriu no contexto da chamada "Guerra Fria", um conflito político-ideológico entre as duas maiores potências mundiais existentes entre as décadas de 1940 e 1990, os Estados Unidos capitalista, e a União Soviética socialista. Esses países emergiram como superpotências após o fim da 2ª Guerra Mundial, e então deram início a um estado de tensão geopolítica crescente, ao tentarem ampliar cada vez mais seu poderio militar e sua zona de influência entre os demais países do globo.
Charge retratando o conflito global entre EUA e União Soviética |
Nesse contexto de competição declarada, os dois países rivais estabeleceram uma corrida armamentista e tecnológica, lutando pela supremacia em praticamente todas as esferas de atuação, inclusive nos esportes. Daí o motivo pelo qual o match entre Spassky e Fischer ser considerado um momento icônico da Guerra Fria: pela primeira vez após 25 anos de dominação soviética no cenário enxadrístico internacional, um jogador ocidental havia se qualificado para a final do Campeonato Mundial, e tinha chances reais de vitória! Essa ameaça representada por Fischer assombrava as autoridades soviéticas, cujo governo totalitário havia investido pesado durante décadas no desenvolvimento do xadrez nacional, a fim de transformá-lo numa arma na guerra ideológica travada contra o Ocidente; havia, por parte dos líderes do regime socialista, a intenção de utilizar o xadrez como símbolo da superioridade intelectual soviética sobre o Ocidente "decadente". Para se ter acesso a um relato completo sobre "O Match do Século" e sobre como o xadrez foi empregado como ferramenta política durante a Guerra Fria, recomendamos a leitura do excelente livro Rei branco e rainha vermelha: como a Guerra Fria foi disputada no tabuleiro de xadrez, do historiador britânico Daniel Johnson, obra da qual já falamos aqui no blog (https://batalhadementes.blogspot.com/2019/02/secao-vale-pena-conhecer.html).
Spassky vs. Fischer no Campeonato Mundial de 1972 |
Apesar de Fischer ter perdido a primeira partida do match contra Spassky, após realizar uma incompreensível captura de peão que lhe custou um bispo numa posição empatada, ele se recuperou e venceu a disputa pelo placar de 12,5 x 8,5 (+7 -3 =11), convertendo-se assim no 11º campeão mundial de xadrez e quebrando a hegemonia soviética no jogo. Um dado interessante é que Johnson, no livro supracitado, afirma que, ao derrotar Spassky, Bobby Fischer não só conquistou o título máximo do xadrez, mas também desempenhou um papel muito importante ao preparar o terreno para a vitória do Ocidente na Guerra Fria, que viria a culminar no colapso do regime soviético no início da década de 1990: "Ao romper o confortável monopólio dos grandes mestres soviéticos, Fischer criou o que se tornou conhecido como o 'boom Fischer' no Ocidente. [...] Mas Fischer também teve um papel num palco muito maior. Ao provar que a União Soviética podia ser derrotada por um único indivíduo, encorajou dissidentes de todas as partes. A Guerra Fria terminou porque os soviéticos perceberam que não poderiam vencê-la - tanto no nível intelectual quanto no político ou no econômico. Essa percepção começou a surgir com Bobby Fischer e 'essa coisinha entre mim e Spassky'".
Sei que esta partida é conhecidíssima, mas, se alguém ainda não tiver visto a primeira partida do "Match do Século", pode visualizá-la clicando aqui. Salve Bobby Fischer, um dos maiores heróis do Ocidente na luta contra o "Império do Mal¹"!
¹ Império do Mal: Expressão aplicada à União Soviética, em 1983, pelo então presidente dos Estados Unidos, Ronald Reagan.
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