No dia 27 de novembro de 1938, há exatos 82 anos, terminava na Holanda o lendário torneio de AVRO, um dos mais importantes de todos os tempos. Pela primeira vez na história do xadrez, os oito melhores enxadristas do mundo se reuniram para jogar um torneio a duplo turno (todos contra todos, ida e volta). Os competidores desse supertorneio foram o então campeão mundial Alekhine, os ex-campeões mundiais Capablanca e Euwe, o futuro campeão mundial Botvinnik, e mais quatro aspirantes ao trono, Fine, Reshevsky, Keres e Flohr. O seu nome teve origem na sigla formada pelas palavras Algemene Vereniging Radio Omroep, que era o nome da companhia holandesa de radiodifusão que organizou e patrocinou o evento. Segundo comenta Kasparov em Meus Grandes Predecessores, o torneio de AVRO funcionou como uma espécie de divisor de águas, ao marcar o declínio dos antigos reis do xadrez (Capablanca, Alekhine e Euwe) e o surgimento de uma nova geração de estrelas, que estariam destinadas a brilhar por muito tempo no firmamento enxadrístico. Com a palavra, o "Ogro de Baku": "Esse torneio significou o final da era dos titãs, que haviam reinado sobretudo pelo seu talento natural, marcando o começo da era do profissionalismo do xadrez, sem o qual, hoje, são impensáveis grandes conquistas".
Alguns participantes de AVRO. Da esq. para dir.: Euwe, Alekhine, Flohr e Keres |
A fortíssima competição foi brilhantemente vencida pelo jovem estoniano Paul Keres, de 22 anos, que terminou invicto, com 8,5 pontos em 14 possíveis (três vitórias e onze empates). Keres logo se transformaria em um sério candidato ao título mundial, porém, apesar de ter tentado ao longo de décadas, jamais chegaria a alcançar a coroa do xadrez. Com a mesma pontuação do campeão, o segundo colocado no critério de desempate foi o estadunidense Reuben Fine, de 24 anos. A classificação completa do torneio encontra-se mostrada a seguir.
No. | Nome | Total | ||||||||
---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|
1 | Paul Keres | 8½ (+3 -0 =11) | ||||||||
2 | Reuben Fine | 8½ (+6 -3 =5) | ||||||||
3 | Mikhail Botvinnik | 7½ (+3 -2 =9) | ||||||||
4 | Alexander Alekhine |
7 (+3 -3 =8) | ||||||||
5 | Machgielis Euwe | 7 (+4 -4 =6) | ||||||||
6 | Samuel Reshevsky | 7 (+3 -3 =8) | ||||||||
7 | José Raúl Capablanca | 6 (+2 -4 =8) | ||||||||
8 | Salomon Flohr | 4½ (+0 -5 =9) |
Quanto ao 3º colocado, Mikhail Botvinnik, que 10 anos mais tarde se consagraria campeão mundial, seu jogo causou uma boa impressão pela consistência, e é dele a mais bela partida do torneio, sua memorável vitória sobre Capablanca, em que foi jogada uma das mais brilhantes combinações da história, por sua precisão matemática, iniciada pelo lance 30. Ba3!!, um sensacional sacrifício de bispo para desviar a dama da defesa do rei negro. Esta partida é bastante conhecida, mas você pode visualizá-la clicando aqui. São também dignos de menção os dois confrontos entre Alekhine e Capablanca, que estavam inimizados há anos e haviam se encontrado raras vezes frente ao tabuleiro desde o match pelo campeonato mundial de 1927... o primeiro jogo entre os velhos rivais terminou empatado, mas Alekhine venceu o segundo com as peças brancas, superando a Defesa Francesa do gênio cubano (veja essa partida clicando aqui). Finalizada a competição, tanto Keres quanto Botvinnik buscaram iniciar negociações para disputar um match válido pelo título mundial contra Alekhine, mas essas negociações não resultaram em nada concreto... lamentavelmente, no ano seguinte (1939), estourou a 2ª Guerra Mundial, inaugurando um dos capítulos mais tristes da história da humanidade e encerrando uma era de ouro no xadrez. O torneio de AVRO, que assinalou o início da era do profissionalismo no xadrez, será sempre lembrado por todos os amantes do nobre jogo, por sua relevância histórica e pela qualidade dos seus confrontos.
O campeão Keres recebendo a premiação pela sua vitória em AVRO |
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